sábado, 24 de agosto de 2013

Décimas cá do burgo


Quem te viu e quem te vê
 
Mote
 
Neste Alentejo esquecido
Só o Alqueva é exceção
Eu peço a Deus, como amigo
 Que nunca lhe falte o pão!
 
I
Quem te viu e quem te vê
Meu Alentejo adorado
Hoje está envergonhado
Não dá emprego a ninguém.
Alguns patrões vivem bem
À conta de subsídios
Os campos de cultivo
Estão devolutos e cercados.
Aqui só pastoreiam gados
Neste Alentejo esquecido.
 
II
Na indústria e agricultura
Já não há investimento
O comércio dá-lhe o vento
Se cai, ninguém o segura.
Alentejo dava fartura
Se alguém lhe deitasse a mão
Tem um solo de eleição
E um bom microclima.
Tem tudo para estar em cima.
Só o Alqueva é exceção.
 
III
Tem mão-de-obra qualificada
E boa gente para trabalhar
Se houvesse fábricas a laborar
Não precisava mais nada.
È uma região demarcada
De vinhedos sem paralelismo
Tem qualidade o turismo
E é nobre na cultura
Desenvolvimento na agricultura
Eu peço a Deus, como amigo.
 
IV
O seu pequeno progresso
Foi as estradas construídas
Ruas, jardins, avenidas
Tudo pago e, a bom preço.
O país em retrocesso
Convida á emigração
Diz o povo e tem razão.
Alentejo é impoluto
Pode até faltar conduto
 Que nunca lhe falte o pão!
 
José Chilra

 

Vícios são vícios
 
Mote
 Já me deixei de beber
Já me deixei de fumar
Agora passei a ter
Um só vício a sustentar
 
I
A minha bebida é água
E não dispenso o cafezinho
Todavia tenho a mágoa
E as saudades dum copinho.
Verde, maduro, sendo vinho
O que importa é o sabor
Cerveja, whisky, licor
São bebidas para esquecer.
Para respeitar o doutor
Já me deixei de beber.
 
II
Adegas e bons petiscos
Já risquei da minha agenda
Para não colocar em risco
A saúde, que é uma fenda.
Só em tabaco é uma renda
Para os pulmões um castigo
Este vício é um inimigo
Mas que teimo em abraçar
Amanhã quero ver se digo.
Já me deixei de fumar.
 
III
Já não vou ao futebol
Nem ligo ao computador
Já não danço o rock in rol
Nem canto o fado menor.
Só jogo cartas de amor
Sou crente em astrologia
Faço a minha poesia
Escolho um bom livro para ler.
Tempo para a fotografia
Agora passei a ter.
 
IV
Nos casinos e discotecas
Não entro para não pecar
Não quero sair em cuecas
Nesses seus jogos de azar.
Já ninguém me vê caçar
A pesca é uma mania
Viajar é uma utopia
Vou vivendo para amar
Eu tenho para minha Maria
Um só vício a sustentar.
 
José Chilra


 

Carta de uma mãe para o filho na França

 

Mote
 

Meu filho, vou-te conta
As notícias da nossa aldeia
Eu tenho que desabafar
Senão morro de apneia
 
I
Há um mês que ando doente
À rasquinha duma perna
O teu pai não sai da taberna
Só me cheira a aguardente.
A tua irmã disse à gente
Que se vai divorciar
Teu cunhado anda a falar
Que anda metida com outro.
Foi bem feito dar-lhe o troco
Meu filho, vou-te contar.

II
O teu tio Niquita Ranhó
Teve ontem um AV SEI
E por ter fugido à lei
Foi de cana o teu avô.
A tua tia mete dó
Anda triste e já vareia
Diz que a coisa está feia
Mas ainda se endireita.
Como vês são só maleitas
As notícias da nossa aldeia.

III
O Sapateiro bateu a bota
No baile de São João
Dizem que foi coração
Por brigar com o Zé da horta.
A tua noiva tão devota
Estava lá para contar
Toda a gente a viu dançar
Com o Chiquinho Entalado.
Meu filho, ao ver-te encornado
Eu tenho que desabafar.

IV
A nossa vizinha Maria
Teve um filho do Felisberto
 O teu sobrinho está tão esperto
Que até chama cabra á tia.
Chama vagina à Virgínia
À avó chama baleia
A tua irmã volta e meia
Dá-lhe uma orelhada a brincar.
Meu filho, vou terminar
Senão morro de apneia.



José Chilra
 
 
Caçadores de vistas largas

 
Mote
 
São humildes e honrados
Os caçadores da nossa praça
Eu digo que são tramados
 Mas só em dias de caça.
 
I
Ainda mal rompe o dia
E já no campo deserto
 Os fiéis de Santo Humberto
Vão testando a pontaria.
Caminham léguas diria
Pelos campos coutados.
Às vezes são apanhados
Fugindo às normas da lei.
Os caçadores cá da grei
São humildes e honrados.
 
 
II
Levam armas, munições
E carros superlotados
Levam negaças, furões
 Catanas, paus e machados.
Todos vão muito bem armados
Com imensos cães de caça.
Matam o bicho na tasca
Partilham o seu farnel.
Matam de forma cruel
Os caçadores da nossa praça.
 
III
Usam penas nos chapéus
Vão trajados a rigor
Quando exibem seus troféus
Dizem que são os melhores.
São vaidosos e impostores
A mentir são diplomados
Tem fama de fazer estragos
Dizem os donos das terras.
Os caçadores doutras guerras
Eu digo que são tramados.
 
 
 
.IV
Caçam lebres e perdizes
 E ainda umas galinholas,
Coelhos, tordos, rolas,
Pombos, Patos e codornizes.
Desde Pedreiros a juízes
Homens de todas as raças.
Trocam mimos e chalaças
Nesses caminhos cruzados.
Todos são divorciados
Mas só em dias de caça.
 
 
José Chilra
 
 
 


 

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